sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Filtro Solar: uma percepção das entrelinhas...

Por Lázaro Lamberth

Acredito que todos já tenham visto aquele famoso vídeo Filtro Solar, uma campanha publicitária produzida pela agência DM9DDB que fez grande sucesso em todo o mundo, em função de sua produção emotiva e reflexiva. Intitulado de "Sunscreen", o filme não se apresenta como uma propaganda comercial, que visa vender um produto, mas sim como um vídeo institucional de caráter conscientizador.

Fala-se que a idéia para o comercial veio de um texto lido por um orador em uma cerimônia de formatura nos EUA no ano de 1997, como um suposto depoimento de um portador de câncer de pele em virtude da não utilização do filtro solar. Em resumo, a campanha é tanto um alerta para que se faça uso do filtro solar, cujo benefício é cientificamente provado, quanto uma sucessão de conselhos nos quais o autor sugere maneiras de se levar uma vida “melhor”, tendo por base sua própria experiência.

Composta por palavras e imagens, a propaganda do filtro solar apresenta cenas do dia-a-dia, seguidas de frases simples que, embora pareçam falar de várias coisas ao mesmo tempo, prende a atenção do receptor e se instala no seu subconsciente, levando-o a compactuar com a idéia lançada inicialmente — o uso do filtro solar.

É interessante notar que o parágrafo inicial é composto, em nível de materialidade não verbal, apenas de imagens do céu, com nuvens em movimento; o que talvez subentenda a provável e posterior morte do sujeito, na posição de depoente, em função da não utilização do filtro solar.

Por outro lado, é interessante ressaltar que, embora o sentido principal da propaganda seja incutir na mente do consumidor a importância do uso do filtro solar, a menção da palavra “filtro solar”, no âmbito da materialidade verbal, aparece apenas no início e no final da peça publicitária, e sequer aparece no vídeo da campanha. Tal situação remete-nos sutilmente a um sentido amplo e conotativo da função do filtro solar, que é a proteção. Ao recomendar o uso de tal produto, tendo por base a sua comprovação científica, o autor implícita a importância da proteção em tudo que fizermos na vida. Ou seja, uma vez que o resto dos conselhos dados possuem outra base confiável além da sua própria consciência errante, o autor subentende que podemos fazer o que quisermos da vida, contanto que nos protejamos.

Desta forma, pode-se verificar o efeito de sentido de verdade no texto a partir do momento que o enunciado “Nunca deixem de usar o filtro solar!”, embora seja uma simples insinuação ao uso de um protetor solar, é atribuído ao depoente Tim Cox, que passa a ter credibilidade enquanto sujeito em função de seu suposto conhecimento de causa dos riscos da não utilização do filtro solar, uma vez que o mesmo foi vítima de câncer de pele.

Uma vez que se estabelece o discurso como ponto de articulação entre processos ideológicos e fenômenos lingüísticos, se faz necessário observar as posições ideológicas presentes na propaganda do filtro solar. O fato do produto não aparecer na campanha publicitária subentende a importância dada aos valores ideológicos transmitidos através dos “conselhos” dados, entre os quais, a utilização do filtro solar.

Como vimos, o autor utiliza uma estratégia complexa, durante a qual fala não só do filtro solar, destacando seus benefícios cientificamente provados, como também aborda questões concernentes à vida em sociedade, sentimentos próprios e alheios, saúde, família, dentre outros, alternando suas abordagens sempre entre a ideologia e a comprovação científica. Vê-se isso em trechos como “Não ature gente de coração leviano”, “Esqueça as ofensas”, “Não se sinta culpado por não saber o que quer da vida”, “Dedique-se a conhecer seus pais”, etc, que refletem valores ideológicos, em paralelo com trechos como “Nunca deixem de usar filtro solar”, “Use fio dental”, “Tome bastante cálcio”, “As suas escolhas tem sempre metade das chances de dar certo”, que são imposições baseadas na proteção, tendo a comprovação científica como base. Todos esses “conselhos” se desenvolvem e fazem sentido a partir do momento que o autor expressa através das suas palavras uma formação ideológica adquirida ao longo da vida.

É interessante notar também que o fato da propaganda não se restringir em falar somente do filtro solar, mas também de diversos assuntos, todos eles co-relacionados como um todo, revelam a formação ideológica do sujeito, onde seus valores são transmitidos no discurso através duma formação discursiva, durante a qual o autor diz o que pensa, através dos seus “conselhos”, que nada mais são do que a incitação de novos costumes, proporcionando a possibilidade de melhorar a vida e manter laços afetivos com o mundo à sua volta. Dessa forma, é coerente afirmar que a propaganda influencia de maneira pertinente o modo de pensar, agir e viver no meio social.

Por outro lado, quando se lembra que as formações discursivas e ideológicas variam de pessoa para pessoa, diferentes sentidos podem ser extraídos do mesmo discurso. Uma análise mais profunda do texto revela que o homem, enquanto sujeito da história e transformador da própria vida e da sociedade, é um ser complexo. Questões ligadas a tal complexidade são encontradas em diversas partes da propaganda. A contradição, a indagação do incerto, do duvidoso, permeia todo o texto, embora de forma harmônica e controlada. Um exemplo seria a questão política, sobre a qual o autor declara: “os preços vão subir, os políticos são todos mulherengos [...]”, e quebra posteriormente este paradigma ao afirmar que mais tarde reconheceremos que “os preços eram razoáveis, os políticos eram nobres [...]”. Tal ruptura reflete formações discursivas que, num primeiro momento, abordam o discurso político social, partindo da memória discursiva acerca da corrupção política e que, num segundo momento, abordam as “nobres” ações de alguns políticos após determinado período.

No final da propaganda, quando o autor retoma o conselho da utilização do filtro solar, faz um jogo simultâneo entre o empirismo, ações que por muitas vezes fogem do planejado e a lógica, que é a comprovação científica. Em outras palavras, deixa claro que a única coisa que ele pode afirmar como certo, tendo comprovação científica, são os benefícios, em longo prazo, do uso do filtro solar. Os demais conselhos dados durante a propaganda basearam-se única e exclusivamente na sua própria experiência. Dessa forma, o conjunto de valores, crenças e incertezas fazem parte da subjetividade humana, que, partindo do pressuposto que a mesma se desenvolve a partir de nossas relações sociais, podem e devem variar de pessoa para pessoa.

Embora a vida possa ser levada de forma “simples”, a vida em sociedade é composta de pensamentos lógicos, porém incertos, de maneira que as diversas experiências de vida requerem um estudo diferenciado, a depender do caso. A propaganda do filtro solar é arquitetada sob esse ponto de vista. Por isso, tudo resume-se no “talvez”, pois as ações e reações são únicas, de pessoa para pessoa, não podendo, portanto, serem defendidas como verdades imutáveis. A leitura individual de cada ser, que é o que entendemos por “pensamento complexo”, é o que irá determinar o que é certo ou não segundo a personalidade, valores e padrões de conduta de cada ser.

Confira o vídeo abaixo:


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Sobre o blog

Neste blog você encontrará um pequeno acervo dos trabalhos e textos que desenvolvi para algumas disciplinas do curso de Jornalismo, bem como comentários, críticas e reflexões sobre assuntos da atualidade. Seja bem vindo!

Porque Lamberth

As pessoas me perguntam o porquê do sobrenome Lamberth, uma vez que o mesmo não integra o meu nome oficial, Lázaro Britto dos Santos. Pois bem, Lamberth surgiu da brincadeira de uma amiga que, por gozação, só me chamava de Lázaro Lamberth. A brincadeira pegou, a sonoridade combinou e em decorrência, fiquei mais conhecido pelo sobrenome Lamberth do que Britto. Além disso, adotei o Lamberth devido ao enorme carinho que tenho pela madrinha do mesmo.

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"A Nova Mídia", de Wilson Dizard. Vale a pena!!!

Devo mudar o nome do meu blogger?


Um Pedaço de Mim

UM PEDAÇO DE MIM é uma Biografia de Auto-ajuda com 127 páginas que escrevi em 2003 sobre minha experiência na luta contra um tumor maligno no joelho. Na época, fui operado e tratado no Hospital Aristides Maltez (de Salvador-Bahia), pelos médicos Alexandre Machado Andrade (especializado em Ortopedia Oncológica) e Maria Giselda N. Rocha (especializada em Oncologia Clínica). Hoje, após anos de lutas e vitórias, encontro-me curado e meu interesse em passar para o papel minha experiência foi pelo simples desejo de usá-la para orientar e encorajar outros que estejam lutando contra o câncer.

Veja o release da obra abaixo:


Por Neuza Leite

Um Pedaço de Mim é um livro simples, de autoria amadora e produção independente. Conta a história de um jovem que, aos 19 anos, descobriu um tumor ósseo no joelho. A obra mostra de forma clara e realista que a vitória sobre o câncer ainda é algo imprevisível, pois, ainda existem algumas formas da doença em que bem pouco pode ser feito, apesar do grande avanço da medicina em diagnosticar e tratar o paciente.

Por outro lado, quando se trata de nossa vida, toda e qualquer batalha sempre vale a pena! Esse senso de valorização pelo que de direito é nosso, é justamente o que o autor procura passar para seus leitores – e de certo modo – ele atingiu seu objetivo, pois seu livro ensina-nos de forma ímpar e magistral, como amadurecer com as adversidades, a enfrentar as perdas, as deficiências e os contratempos que uma enfermidade nos apresenta.

Um Pedaço de Mim revela-nos seus métodos utilizados no combate à doença, bem como o que ele sugere de natural, espiritual e psicológico a uma pessoa que esteja lutando ou auxiliando "entes queridos" na luta contra esta implacável doença. O livro é composto também de cinco anexos que relatam um breve histórico do câncer; como surge, principais tipos, causas, fatores de risco, prevenção e formas de tratamento médico e psicológico aos pacientes afligidos pela doença.
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